quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Nos bosques, perdido, cortei um ramo escuro

VI

NOS BOSQUES, perdido, cortei um ramo escuro
e aos lábios, sedento, levantei seu sussurro:
era talvez a voz da chuva chorando
um sino fendido ou um coração cortado.

algo que de tão longe me parecia
oculto gravemente, coberto pela terra,
um grito ensurdecido por imensos outonos,
pela entreaberta e úmida escuridão das folhas.

Por ali, despetando dos sonos do bosque,
o ramo de avelã cantou sob minha boca
e seu vagante olor subiu por meu critério

como se buscassem de repente as raízes
que abandonei, a terra perdida com minha infância,
e me detive ferido pelo aromo errante.

Pablo Neruda, 1904-1973
NERUDA, P. Cem sonetos de amor. Porto Alegre : L&PM, 1997.
Tradução de Carlos Nejar.

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